Em tempos de cortes no orçamento público e reformas que penalizam os cidadãos que não fazem parte do estrato mais rico da sociedade (que pode até ser resumido, de certo modo, em mais ou menos 1% da população), há de se perguntar se é realmente justo que, numa suposta tentativa de melhorar a economia e as taxas de desemprego, use-se a tática de precarizar ainda mais a situação financeira da parte menos rica da população, ou, para dizer de outra forma, da parte mais pobre da população.
Na verdade, o que os poderes políticos e econômicos instituídos desejam é aumentar ainda mais a sua já escandalosa superioridade monetária em relação ao resto do mundo (pois se trata, aqui, de um processo global).
Nesse sentido, é importante lembrar o estudo, (relatório original aqui) apresentado neste ano (2017) no Fórum Econômico Mundial de Davos, feito pela ONG Oxfam, que, entre outras coisas, mostra que:
. Oito homens brancos detêm a mesma riqueza de toda a metade mais pobre da população mundial *
. 1% da população mundial detém a mesma riqueza dos 99% restantes **
. Os 50% mais pobres do planeta detêm menos de 0,25% da riqueza mundial ****
* Relatório Oxfam, página 2
** Relatório Oxfam, página 12
*** Relatório Oxfam, página 5
**** Relatório Oxfam, página 11
O relatório pode ser acessado aqui:
"Uma economia para os 99%"
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Reportagem da Deutsche Welle:
"ao mesmo tempo em que muitos salários se encontram estagnados, as remunerações dos presidentes e altos diretores de grandes empresas têm disparado. 'Os investimentos em saúde e educação são cortados, enquanto as corporações e os super-ricos reduzem ao mínimo sua contribuição fiscal'".
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Dentro do sistema econômico em que vivemos, certas profissões, cargos e posições são excessivamente mais bem recompensadas monetariamente do que outras, de maneira injustificável, uma vez que a carga e a importância do trabalho não são tão diferentes a ponto de gerar tamanho abismo.
O capitalismo é como um cavalo selvagem. Ele precisa ser domado para que a Humanidade caminhe com ele proveitosamente, sem risco de se machucar com coices e movimentos bruscos - e de perder o seu rumo.
Caso contrário, ele pode gerar uma desigualdade tão extrema, em termos de renda, que chega a obstruir os direitos que, como civilização, decidimos que são básicos para qualquer ser humano.
A maneira mais conhecida de domar o capitalismo é através das leis - particularmente, dos impostos e sua utilização na concessão de direitos sociais universais, como acesso à saúde, à instrução, a uma vida segura e à aposentadoria, e do estabelecimento de um valor mínimo para o salário de todas/todos as/os trabalhadoras/es, que lhes permita uma vida plena, do ponto de vista aquisitivo.
Os impostos que deveriam compor a maior parte do montante arrecadado são os ligados à renda, como salários, lucros e dividendos, com uma gradação que incida com porcentagens cada vez maiores, à medida em que os rendimentos aumentem.
Mais recursos estariam disponíveis, assim, para ser investidos nos serviços públicos referidos acima - e, também, no sistema previdenciário, que não dependeria somente das contribuições de trabalhadores e empregadores.
A divisão em estratos de riqueza ainda existiria, mas a distância entre um e outro não seria tão grande (ou imensa, como é hoje).
Ao mesmo tempo, o desejo do enriquecimento ou da manutenção da riqueza, que move tantos e é considerado por muitos o motor do desenvolvimento, conservaria o seu espaço - dando maior relevo, porém, à importância dos outros valores da vida.
A isenção dos impostos ligados ao consumo, especialmente aos produtos mais básicos e também aos que podem proporcionar a evolução de toda a sociedade, também é justa e necessária, além de benéfica para todos os estratos sociais.
Mas elaborar leis não é suficiente.
Paralelamente a isso, para que os indivíduos que ocupam os cargos públicos, responsáveis pelo manejo dos recursos arrecadados, os utilizem de forma honesta e competente, é fundamental haver também uma mudança ética na sociedade como um todo.
Não se pode esperar que essa mudança venha exclusivamente a partir dos/das governantes, legisladores/as e juízes/as. Afinal, eles/elas refletem e reproduzem, sob vários ângulos, o que nós somos como coletividade.
A regeneração deles/delas está condicionada à de toda a população, e esta só acontecerá quando cada um de nós procurar constantemente se transformar para melhor, tanto em relação ao cumprimento das leis institucionalizadas, como também quanto ao senso de justiça e respeito nas relações cotidianas com outras pessoas, sejam próximas ou estranhas.
Quando uma pessoa busca sinceramente evoluir eticamente, toda a sociedade evolui junto com ela. Toda pessoa faz diferença. Suas atitudes, comportamentos e mentalidades influenciam a maneira como o mundo caminha. E todos temos margem para tornarmo-nos seres humanos melhores, sempre.
Tomando as rédeas da evolução de nossas vidas particulares, em termos de honestidade, cuidado, solidariedade, responsabilidade e respeito, estamos tomando as rédeas da evolução de nossa vida como sociedade.
Um comentário:
Que bom que em meio ao desgoverno que vivenciamos globalmente, podemos acender uma luz de esperança: luz própria, interior, da ética e do bom senso. Se muitas vezes, nos últimos tempos, tenho esmorecido internamente, essas palavras reacederam minha confiança e acalentaram meu coração.
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