N'água e na pedra amor deixa gravados
seus hieróglifos e mensagens, suas
verdades mais secretas e mais nuas.

"Entre o ser e as coisas"
Carlos Drummond

quarta-feira, 31 de julho de 2013

A noite cobre os cristais
a rasgar a pele negra dos sonhos,
andarilhos erram no asfalto molhado
que brilha no silêncio das gotas.

Um raio penetra a expectativa das paredes,
luz de abismo acende dentro
e fura as pálpebras
se espalhando sem fronteiras
no sereno do inaudito orvalho.

Os acordados fluem aromas
na discrição de um canto soprado
de poste em poste,
abarcando com seu brando timbre
todas as partículas do ar
que os ouvidos respiram.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Os andantes estão deitados:
bênçãos caem sobre a cidade
como chuva fina modulando o sono,
no sereno refletindo o azul-escuro do céu.

Escondidos nas batidas que não se ouve,
os sonhos se infundem de umidade,
nutrindo as imagens do tom delicado
que sopra o amor como um sussurro.

Anjos discretos se expandem,
guardando a enorme vila em sutil
inspiração, 
cansando as asas no atrito do ar
que não acolhe plena sua descida.

Insistindo no descabido propósito,
absorvem, num retorno efêmero ao sol,
o peso dos abismos,
derramando-se oblíquos
como impalpável perfume 
no fundo do ser.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Caligrafia

O tempo é a eternidade se movendo.

Sempre foi, sempre será,
fluindo na embocadura dos eventos,
luminoso gume,
imagens escorrendo em perene
e espantoso desenho.

sábado, 13 de julho de 2013

Aterramento

I

Marcos teve os pés decepados na guerra.
É por isso que flutuava.

Os doutores enfronhavam robôs.
Chips vinham ao socorro, partindo de cérebro e mãos.
Cérebro e mãos construindo pés.

II

O século traz uma nova seiva.
Sangue fertiliza e se afeiçoando brota.
A carne, recém-nascida, aos trancos vive e se junta.
Não é mais tempo de engrenagens.
Ludibriando a anciã natureza, mais se a humaniza.

Batizando nos pés impresumível valor,
Marcos afunda-os na úmida terra.

Nunca o frio plantado
e o cheiro encorpado foram tão gratos.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Propósito

Encarnar.
Pisar o chão com pés fortes na gravidade.
Calcanhar e dedos num fincar consorte.

Terra, agarre-me com seu peso incandescente.

Comando meus músculos inscrevendo ideias com ações.
Fisgo o concreto e modelo átomos ao redor de mim.
Palavras organizo e libero em viagens de transformação.

Encontro os seres e interagindo reformamos.