N'água e na pedra amor deixa gravados
seus hieróglifos e mensagens, suas
verdades mais secretas e mais nuas.

"Entre o ser e as coisas"
Carlos Drummond

domingo, 28 de abril de 2013

Alva presença

Você, alisando a inenarrável geografia numa sonífera aduana, respingando sua face de infamiliares contornos na reprodução de inédita ambrosia, aventando em enlevo insolente a fluência nua das impressões morrendo como a água a absorver num impulso a terra acanhada, planando nos horizontes o ir-e-vir dos lampejos e no meio-do-céu explosões de abarcantes gorjeios, palpitações à maneira de eflúvios soberanos subjugando lábios com a ponta dos dedos e visões com inverossímeis clareiras, fincando no centro esquivo dos seres um sutil estrondo, numa alegria distraída que é quase um desprezo.

sábado, 27 de abril de 2013

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Ela, despindo-se na noite

Arisca, sopra um manto de aromas macio num alinhar de fendas vermelhas pela neve. Banhando-se em lições de boticário alisa a camada inflamada sem nela encostar. Coberta de pétalas translúcidas acalenta alunos desavisados que tremulantes no escuro se tateiam. Plantando miradas como fios de rio marulhando doces frases, investe penas a colorir com tintas várias papiros envolvendo pedaços de chão. Assovios tomam conta dos ventos imunes a qualquer violência, intimamente expandindo a presença de amores no intangível. O fogo, no centro de cantigas infantis, corta a noite e preserva inocência em labaredas ancestrais. Dentro do azul carícias agarram a vida entrelaçando resíduos de dores, liberando seiva tornam imagens úmidas abrindo caminho no insondável. No prado fluindo um sono luminoso ela acolhe afeição enquanto o magma num balanço escreve no céu.

terça-feira, 16 de abril de 2013

Voo de parvos

A aeromoça no banheiro esfregava as mãos mas não faiscava. Atadas nas cordas em fiapos só lhes restava erguer as unhas ao mais alto e esperar os dedos de um deus. Os sentinelas usando explosivos de artesão se esgueiravam como minhocas de intrometidos com caças mudos suicidando espancados a bufar. A aeromoça se lembrava de prados perfumados em que certa vez estaria e agarrando o momento se convertia em alma imortal. Fechando os ouvidos em melodia pedia perdão por todos ecoando uma cruz nublada enquanto o azul lá fora permanecia. As cores serão sempre cores à revelia dos néscios pensou ela com a aeronave a flanar.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

fonte-fluxo-ponto

Instante-
passado
presente
futuro
-união.

Plasmando
propósito redesvelado furando.

Fui-estou-vou
num único movimento
pedregulho-abismo
couro de pela
lascando
pó de arroz
quadro de
gorjeios
jorro de
areia.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Prancha

Não vamos fazer estardalhaço. Essa mania de inchar tudo. As coisas são o que são. Aconteceu, aconteceu. Tem que descolar. Vai obstruir alguma coisa? Apaga. Ou melhor: guarda na prateleira. Fica ali, ao aberto, como uma peça cara de coleção que se espaneja quando em quando. Não precisa quebrar, atirar no lixão. O cheiro sempre volta. Deixa. Condensa numa bola de gude, brinca com ela numa hora incerta. Só não junte. Elas caem e fazem barulho. Furam o solo. Joga, bate uma na outra, reúne crianças, ganha, perde, gosta. Os pés não tremam o chão, mas não precisam sussurrar. Só no balanço. Pra lá, pra cá. Aqui. Não espere o fogo na sola. Vêm sempre ondas altas.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Uma aragem resvalando

Novais era seco. Pés secos. Mãos secas. Olhos secos. Ermo de tão seco e mais seco por tão ermo, grudava no gelo e evaporava na faísca mais tolhida. Suas costas desabavam morro acima, as feridas encardiam, em dias de tormenta não deslizava. Caloso e impermeável, atravessava infantes entre margens, soprava raios, abrigava cães nas enchentes. Chorando em surdina, entoava o lamento da aridez que a tudo emprestava. Dançando na viração, novais em cinzas era uma chuva sobre o mar.