N'água e na pedra amor deixa gravados
seus hieróglifos e mensagens, suas
verdades mais secretas e mais nuas.

"Entre o ser e as coisas"
Carlos Drummond

sábado, 9 de junho de 2012

As melodias não se rendem, laceradas ainda

Em uma noite prensada no intervalo de dois dias tensos, Lívia rezava sem convicção. A face de seu pai lhe aparecia como uma pintura, cravada no recesso das suas aspirações. O lago tremulante, refletindo as luzes do morro, lhe sugeria, através da janela e da escuridão, a flutuação inebriante no tom com que a chamava, ora apreensivo, tantas vezes vestido em camada áspera de desnorteamento, ora apático, perdido nas profundezas da sua alma, extraviada do próprio entendimento. A solidez da presença nua e pesada de seus últimos dias se tornava em cinzas diante do inexorável, o compasso surdo e seco do tempo assíduo. Água e sal desciam aos seus lábios, relembrando, à sua sensibilidade dormente, a perseverança rebelde do gosto sobre a insipidez indiferente das horas.

Um comentário:

Gelly A. disse...

A sequência cadenciada de abstrações, marcada em muito pelas aliterações, tem dado aos últimos textos uma sonoridade muito bela. Já o sentido me pede mais tempo...