N'água e na pedra amor deixa gravados
seus hieróglifos e mensagens, suas
verdades mais secretas e mais nuas.

"Entre o ser e as coisas"
Carlos Drummond

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Os sentidos do vento palpável



“É ótimo ser espírito e testemunhar por toda a eternidade apenas o lado espiritual das pessoas. Mas, às vezes, me canso dessa existência etérea. Não quero pairar para sempre. Quero sentir um certo peso, que ponha fim à falta de limite e me prenda ao chão. Eu gostaria de poder dizer ‘agora’ a cada passo, a cada rajada de vento. ‘Agora’ e não mais ‘para sempre’ e ‘eternamente’.”

- Asas do Desejo, Wim Wenders (1987)

Um mergulho no chão que elástico encrosta,
sangrando penas esgotadas,
numa consequência inversa emendando as pernas,
criando tendões e solas com detritos de asas
em cadência pulverizando farelos de cascas
como areia aderente fixando ideias no solo.

Esquecendo o inexorável movimento
de ventos alheios a qualquer controle
para carregar a densidade vácua das escolhas,
esquivando sem sucesso a incerteza
no escondido encanto da pretérita indiferença.

Encarno o não-saber saudando os limites do horizonte,
no momento as direções se abrem, imediatas
e presas a passos e saltos sem voo –
não enxergo no escuro e sinto sono,
ouço as cordas alvejadas do piano
que pesa e responde a meus dedos com acordes,
tudo me exige estudo,
dobro os joelhos e perco fôlego em escadas.

Não tenho nada além do agora
que foge e retorna a cada instante.

As brisas são carícias,
azul e amarelo se casam na aurora,
frutos exalam gostos,
nenhum silêncio abafa o respiro
da beleza que sem remorsos findará –
não pairo, piso gravidade
furando a terra e vertendo a vida mortal.

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